Os julgamentos em ambientes virtuais – uma prática adotada pelo Poder Judiciário de todo o Brasil devido à pandemia da Covid-19, mas que está tendo continuidade na pós-pandemia – estão provocando atritos entre os Tribunais de Justiça (TJs) e as seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) nos estados.
O alerta é do conselheiro federal da OAB no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Mansour Elias Karmouche, explicando que alguns tribunais têm estabelecido novos critérios para os julgamentos virtuais em casos de recursos, retirando dos advogados o direito de apresentar suas alegações orais no julgamento de seus recursos, assim como as contrarrazões do recurso da parte adversária.
Um exemplo é a da Resolução nº 903/2023, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), determinando que, nos casos dos embargos de declaração e dos agravos internos, não cabe sustentação oral e, portanto, devem ser julgados obrigatoriamente de modo virtual.
“Antes dessa norma, advogados costumavam peticionar para que esses julgamentos ocorressem de modo presencial ou telepresencial”.Explicou Mansour Elias Karmouche, informando que o conselheiro Marcello Terto, do CNJ, já concedeu liminar para determinar a imediata suspensão dos efeitos dessa resolução a pedido da OAB-SP e da Associação dos Advogados de São Paulo (Aasp).
“Se você for analisar o Poder Judiciário como um todo, para que você precisa dessa estrutura toda se não for para receber alguém? Porque senão, fica todo mundo da sua casa, não precisaríamos de fóruns do tamanho que eles são, não precisaríamos de tribunais de Justiça gigantescos, pois você trabalharia de casa”.Pontuou.
Ainda no entendimento do conselheiro federal da OAB no CNJ, ao priorizar o digital, os tribunais de Justiça acabam tornando a Justiça uma coisa mecânica e feita às escuras, contrariando um dos pilares do Poder Judiciário, que é justamente a transparência.
“Muitos tribunais estão jogando todos os julgamentos para o ambiente virtual, os quais não têm sustentação oral. Então, acaba acontecendo uma limitação mesmo, porque, às vezes, eles nem respeitam a oposição e, nos agravos internos, também eles impedem o advogado de fazer a sustentação oral”.Reclamou.
Mansour Elias Karmouche reconheceu que os julgamentos virtuais foram extremamente necessários durante a pandemia, mas, agora, não há mais necessidade.
“Não pode deixar no ambiente virtual tudo que é processo. E também é preciso garantir para os julgamentos dos agravos internos o direito do advogado poder se manifestar. Porque, às vezes, o desembargador julga monocraticamente e impede de o advogado fazer sustentação oral no agravo interno”.Alertou.
PEC
Segundo o conselheiro da OAB, a questão está tomando uma proporção tão alarmante que a Ordem encaminhou ao Congresso Nacional uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para assegurar à advocacia o direito de realizar sustentação oral nos tribunais brasileiros, especialmente no Supremo Tribunal Federal (STF).
Ele lembrou que há duas semanas o presidente da OAB Nacional, Beto Simonetti, e o vice-presidente, Rafael Horn, entregaram ofício ao presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco, destacando essa PEC.
“O texto foi aprovado, por unanimidade, pelo Conselho Pleno em 15 de abril, com o apoio das 27 seccionais da OAB. A PEC busca modificar o Artigo 133 da Constituição Federal, garantindo a obrigatoriedade – nos termos dos princípios de acesso à Justiça, do devido processo legal e da ampla defesa e contraditório – da sustentação oral por advogados em todas as fases do processo judicial, sob pena de nulidade das decisões”.Detalhou.
Mansour Elias Karmouche completou que o direito à sustentação oral representa a voz da cidadania e da democracia plena nos tribunais.
“Embora previsto no rol de direitos e prerrogativas da advocacia da Lei nº 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia e da OAB), e reforçado pela Lei nº 14.365/2022, tem sido alvo de violações recorrentes nos tribunais de Justiça do Brasil”.Argumentou.
A PEC altera o texto constitucional para incluir dois novos parágrafos. O primeiro, assegura o direito à sustentação oral, seja presencial ou síncrona, em todas as instâncias de julgamento por colegiado.
A norma propõe que qualquer indeferimento deste direito acarreta a nulidade do julgamento e da decisão prolatada.
O segundo parágrafo restringe a capacidade dos órgãos do Poder Judiciário de limitar, restringir ou excluir as hipóteses legais de intervenção da advocacia no processo, particularmente a sustentação oral, salvo o disposto no artigo 96, inciso I, alínea “a” da Constituição, que estabelece as atribuições específicas dos tribunais.
Com a informação o Correio do Estado.