Após anos de crescimento e desenvolvimento, a malha aérea brasileira passou a enfrentar desafios devido à pandemia de COVID-19 e suas consequências econômicas.
A perda de rotas internacionais tem ocorrido especialmente no Nordeste brasileiro, que depende do turismo para impulsionar sua economia. Enquanto isso, aeroportos do Sul e Sudeste já se recuperam gradualmente, retomando seu patamar pré-pandêmico.
Um exemplo é o Aeroporto Internacional Tom Jobim, o Galeão, no Rio de Janeiro (RJ), que após anos de negligência, experimenta forte investimento por parte do governo federal e parcerias com a prefeitura local.
No entanto, a situação contrasta com o cenário nordestino, onde a perda de rotas internacionais tem sido mais acentuada. O aeroporto de Recife, por exemplo, viu sua quantidade de rotas internacionais reduzir drasticamente, passando de 16 para apenas cinco, entre os anos de 2019 e 2022, segundo dados da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC).
Segundo o professor de engenharia de transportes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Elton Fernandes, a concentração do tráfego internacional em aeroportos como Guarulhos, na cidade paulista homônima, é um dos fatores que contribuíram para essa redução de rotas.
“O mercado internacional no Brasil está muito concentrado em Guarulhos e deveria estar dividido com o Galeão, mas o Galeão está com problemas devido às condições econômicas do Rio de Janeiro”, explica.
A racionalização das rotas também é apontada como um motivo para a redução, já que as companhias aéreas têm a liberdade de definir sua malha aérea de acordo com a demanda e a lucratividade das rotas. “A companhia aérea tem os seus mecanismos de estudo de demanda, seus algoritmos, que definem as rotas que ela precisa voar e que são mais lucrativas.”
“É difícil precisar por que o Nordeste tem tido perda de rotas internacionais. Mas, realmente, em um período agora pós-pandemia, houve uma racionalização das rotas”, diz Fernandes, se referindo a uma resposta das companhias aéreas à crise, visando otimizar suas operações em meio às incertezas econômicas.
Qual o motivo do aumento das passagens aéreas?
Vale ressaltar que a aviação é um setor fortemente afetado pelo dólar, que maioria dos custos de uma companhia aérea. Para Fernandes, questões econômicas como o câmbio elevado e os custos dolarizados das companhias aéreas têm impactado negativamente a oferta.
“Os custos das companhias aéreas são dolarizados, chegando a mais de 50% devido aos preços do combustível de aviação, leasing da aeronave e outros custos.”
As consequências da perda de rotas internacionais vão além da aviação, afetando diretamente o turismo e a economia local.
O Nordeste, que historicamente depende do setor turístico, ainda enfrenta o desafio de se livrar do isolamento no pós-pandemia. A redução no número de rotas impactou diretamente a chegada de turistas estrangeiros e, consequentemente, a geração de empregos e receitas na região.
“O Nordeste não perdeu atratividade, mas talvez no passado houve excesso de rota e houve um ajustamento para a demanda”, sugere Fernandes.
Em termos de perspectivas para o setor de turismo e aviação, o professor destaca que a recuperação depende das condições econômicas e da renda das pessoas.
“O setor de turismo é um dos termômetros da economia. Dependendo das condições da economia e da renda das pessoas, o turismo pode ser incrementado em termos domésticos.”
Por que viajar de avião é tão caro no Brasil?
Para o diretor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Transportes, Marcus Quintella, o Brasil, em contraste com o passado, abriu mão de ter uma grande empresa de transporte aéreo internacional.
“Hoje temos mais ou menos 30 empresas que fazem a conexão internacional do Brasil, e três delas são mais ou menos brasileiras: Azul, Gol e Latam.”
No entanto, segundo ele, a malha dessas empresas nacionais é restrita, concentrando-se principalmente em destinos como os Estados Unidos e a Europa.
A falta de uma presença robusta no mercado internacional limita a capacidade brasileira de estabelecer conexões diretas com outros países e regiões emergentes, como Ásia e África. “O Brasil está perdendo uma oportunidade muito grande de se conectar através dos BRICS com os grandes mercados emergentes mundiais que estão na Ásia”, opina.
Ainda assim, segundo ele, “o transporte aéreo doméstico tem grandes perspectivas de continuar crescendo”.
Contudo, no seu entendimento, para aproveitar ao máximo esse potencial, é preciso que o Brasil adote uma abordagem mais proativa na promoção do turismo internacional e na diversificação de seus mercados-alvo.