Uma das grandes especialidades do presidente Lula, é a administração de “heranças malditas”. É assim que ele resolve todos os problemas que aparecem em seu governo – tudo é culpa de quem veio antes, mesmo que não haja culpa. Muito pelo contrário: ele põe a casa em ordem, mas um minuto depois já está reclamando que jogaram um desastre sobre ele, e que ele não tem nada a ver com nada de ruim que aconteça até o último dia de seu mandato. Foi assim com o Fernando Henrique. Lula recebeu um Brasil sem o pior problema de sua história econômica — a inflação, eliminada por seu antecessor com o Plano Real. Estava pronta também a privatização das telecomunicações, sem a qual naufragariam o país, a mineradora siderúrgica e os bancos estatais, que funcionavam como a casa da moeda particular dos governadores — e talvez fossem os únicos no mundo a dar prejuízo.
Lula fez bem: aplicou a história desse vigário, e Fernando Henrique, ao invés de expor a mentira, acabou achando que ele, Lula, é agora o homem que vai salvar o Brasil. A história pode se repetir agora – com a diferença de que Jair Bolsonaro dificilmente beijará a mão que Fernando Henrique beijou. O novo presidente já acusa o atual governo dos piores crimes econômicos dos últimos 500 anos, e de todos os outros tipos — e a realidade é exatamente o contrário. Bolsonaro deixará Lula com a melhor situação que o país já teve na transição de um governo para outro, em qualquer época recente.
É o que mostram os fatos e os números, apurados em 12 indicadores-chave da situação da economia brasileira neste momento.
1. Inflação
Dilma Rousseff, sucessora de Lula na Presidência da República, foi afastada do governo, deixando como legado uma inflação que foi uma verdadeira herança maldita. Em agosto de 2016, quando o impeachment foi concluído, o Índice de Preços ao Consumidor — que mede o custo de vida — por 12 meses estava próximo de 9%. Nos Estados Unidos, foi pouco mais de 1% no mesmo período. Em setembro deste ano, os dois países trocaram posições. Desde então, a inflação brasileira tem se mantido inferior à dos Estados Unidos. Em outubro, por exemplo, a variação de preços foi de 6,5% no Brasil e próxima de 8% nos Estados Unidos.
2. Crescimento
A economia também mostra mais desenvoltura em relação ao fim do último governo do PT. Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro encolheu cerca de 4% em 2016. Ao mesmo tempo, o mundo cresceu cerca de 3% e a China registrou expansão de 7%. . Para 2022, o FMI estima um crescimento de quase 3% para o PIB brasileiro. A projeção para o desempenho da economia global e do PIB chinês neste ano é praticamente a mesma de 2016. A recuperação da produção nacional ocorreu mesmo em um ambiente de incertezas internacionais. Além da invasão russa à Ucrânia, iniciada em fevereiro, o governo do presidente Jair Bolsonaro teve de enfrentar um desafio inédito: a pandemia do coronavírus — uma crise sanitária global, que limitou o comércio entre países, quebrou empresas e desorganizou cadeias produtivas. ao redor do globo.
3. Desemprego
Atualmente, a taxa de desemprego no país gira em torno de 8%. Número que só foi menor em meados de 2015, segundo levantamentos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Durante a pandemia, a taxa de desemprego calculada pelo IBGE bateu recorde de quase 15% em dois momentos: julho a setembro de 2020 e janeiro a março de 2021. A destruição em massa de empregos ocorreu na esteira das medidas restritivas adotadas durante a crise sanitária . Contrariando a posição do presidente, as restrições impostas por governadores e prefeitos seguiram a máxima: “Vamos ver a economia
4. Balança comercial
Em 2016, o valor atual da balança comercial brasileira — a soma das exportações e importações — fechou em 20% do PIB do país. Em 2021, a proporção cresceu para 30%. Os dados demonstram um aumento na abertura da economia no Brasil.
5. Superávit primário
Além disso, o superávit primário — formado pelo valor faturado com as exportações menos os gastos com as importações — foi 50% maior. O montante saltou de US$ 40 bilhões em 2016 para US$ 60 bilhões em 2021.
6. Arrecadação federa
l A receita federal está quase 30% maior do que quando Dilma deixou o Planalto. No acumulado em 12 meses registrado em agosto de 2016, o valor ficou pouco abaixo de R$ 1,5 trilhão, segundo dados do Tesouro Nacional. Em setembro de 2022, a soma se aproximava de R$ 2 trilhões.
7. Gastos públicos
A partir de junho de 2022, o governo federal voltou a ter superávit primário nas contas públicas acumuladas em 12 meses, ou seja, as despesas passaram a ser menores que as despesas. O saldo positivo para o mesmo intervalo não ocorria desde novembro de 2014 (quando a economia mundial ainda era extremamente favorável). Nos dados mais atuais, de setembro, o valor extra fechou em praticamente R$ 85 bilhões.
8. Lucro das empresas estatais
As empresas estatais tornaram-se lucrativas. No ano passado, o resultado líquido dessas empresas fechou perto de R$ 190 bilhões, 40 vezes o pouco menos de R$ 5 bilhões de 2016 — e cerca de R$ 230 bilhões a mais do que o prejuízo de R$ 32 bilhões registrado em 2015.
9. Reservas internacionais
Para mitigar os efeitos das instabilidades monetárias, o país dispõe de cerca de US$ 330 bilhões em reservas internacionais. O valor consta do relatório mais atual do Banco Central, e representa o montante de setembro deste ano.
10. Agronegócio
No início de 2022, as cadeias produtivas do agronegócio brasileiro foram ameaçadas pela possibilidade de uma crise no abastecimento de fertilizantes. As preocupações surgiram por causa das sanções impostas à Rússia, por causa da invasão da Ucrânia. Os russos estão entre os principais fornecedores mundiais desse insumo vital para a agricultura. Por meio da diplomacia, o governo federal conseguiu garantir o fornecimento de fertilizantes. Com isso, o agronegócio brasileiro colhe o recorde de 270 milhões de toneladas de grãos em 2022 — marca que deve ser superada em 2023, com estimativa de 310 milhões de toneladas para a próxima safra. Nesse contexto, a produção de carnes — incluindo bovinos, suínos e de frango — continua crescendo. As taxas de crescimento esperadas para 2022 e 2023 são de 1% e 3%, respectivamente. A disponibilidade anual de carne por habitante deve subir para cerca de 3% no próximo ano. Assim, a oferta por brasileiro, descontando o volume exportado, ficará acima de 95 quilos.
11. Parcerias com o setor privado
O governo também deixa um programa de parceria para investimentos com a iniciativa privada que garante a injeção de R$ 1 trilhão, entre investimentos e doações. A extensa lista envolve cerca de 150 projetos, distribuídos nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul e Pará, e arrendamentos de terminais aeroportuários no Paraná e Pernambuco. Ainda considerando as propostas em estudo, a carteira do programa contém 224 projetos. Uma delas, ainda em análise, é a privatização do Porto de Santos. Quando Bolsonaro assumiu, o porto de Santos, o maior da América Latina, registrava prejuízos recorrentes. O saldo das operações em 2018 foi negativo em aproximadamente R$ 500 milhões. Agora, a instalação paga dividendos. O lucro líquido acumulado de janeiro a outubro, por exemplo, já é positivo em R$ 430 milhões.
12. Obras continuadas e terminadas
O atual governo ainda deu continuidade às obras atrasadas, iniciadas em gestões anteriores. Um caso emblemático é a transposição do Rio São Francisco, que passou por paradas em diversos trechos. Após 15 anos de constrangimento e quatro presidentes da República, foi concluída a transposição que pretende garantir água no sertão nordestino. Outro exemplo é a Ferrovia Norte-Sul. As obras começaram em 1985, durante o governo Sarney. A construção do traçado original, que envolve 1.500 quilômetros entre Porto Nacional (TO) e Estrela D’Oeste (SP), deve ser concluída até o final de 2022. Sua estrutura foi planejada para ser a espinha dorsal do transporte ferroviário no Brasil. A lista também inclui a Ponte de Abunã, sobre o rio Madeira, em Rondônia. Inaugurado em maio de 2021, levou sete anos de construção. No painel sobre obras públicas do Ministério da Economia, são citados cerca de 130 mil empreendimentos iniciados em governos anteriores e concluídos no mandato de Bolsonaro. Empreitadas de todos os portes estão na lista: construção e reforma de creches, hospitais, escolas, shopping centers e outros prédios públicos, além de obras como pontes, rodovias e ferrovias. Esse é o legado de um país mais aberto economicamente, com contas públicas equilibradas e em linha com o crescimento mundial, mas que depende da austeridade adotada pelo governo Bolsonaro para se manter. Depois de eleito, Lula questionou, por exemplo, a necessidade de manter o superávit, cortar gastos, garantir a estabilidade fiscal e respeitar o teto de gastos. As falas de Lula sugerem que seu governo seguirá o caminho inverso, rumo ao já conhecido precipício do PT.