Uma pesquisa realizada em 30 países, divulgada nesta terça-feira (12/09), revela que os jovens são os mais propensos a colocarem em dúvida a capacidade dos regimes democráticos de preencherem as necessidades fundamentais da população, o que faz com que aumente a desconfiança nos méritos da democracia como forma de governo.
Segundo um relatório da Open Society Foundations (OSF), 86% dos 36 mil entrevistados em diferentes partes do mundo, incluindo o Brasil, preferem viver em Estados democráticos, enquanto somente 20% acreditam que regimes autoritários estão mais aptos a satisfazerem os desejos dos cidadãos.
Mas, entre as pessoas de 18 a 35 anos, a preferência pela democracia é de apenas 57%, contra 71% dos entrevistados com idades acima de 56 anos. No total, 42% dos mais jovens disseram apoiar regimes militares, contra apenas 20% dos mais velhos.
O relatório da OSF – uma sociedade civil fundada pelo megainvestidor e filantropo George Soros formada por uma rede de doadores – aponta que 35% dos mais jovens acreditam que um “líder forte” que não realiza eleições ou não toma decisões através de consulta aos Parlamentos seria “uma boa forma de governar um país”.
O relatório afirma que “na França e no Brasil – duas democracias que no ano passado viveram concorridas eleições presidenciais entre moderados e autoritários – a forte aderência à democracia como ideal aparece ao lado de um alarmante pessimismo sobre seu atual funcionamento”.
“Apesar de a maioria dos respondentes em ambos os países afirmar que é importante para eles viver em um país democraticamente governado, 50% e 74% dos entrevistados, respectivamente, concordam que as leis atuais não mantêm ‘pessoas semelhantes [a eles]’ seguros”.
O estudo aponta ainda uma série de desafios para a democracia, como as desigualdades sociais e as mudanças climáticas.
Pobreza e corrupção
A pesquisa revelou um forte apoio aos direitos humanos; sendo que a ampla maioria dos entrevistados em todas as regiões e níveis de renda (entre 85% e 95) concorda que os governos erram ao violarem direitos individuais com base em aparência física, religião, gênero ou orientação sexual.
Os itens que geram maior preocupação nos entrevistados são a crise climática, assim como a pobreza e a desigualdade, apontados por 20% das pessoas, seguidas da corrupção, com 18%. Mais da metade (53%) dos entrevistados afirmaram sentir que seus países estão caminhando no rumo errado, e um terço avalia que os políticos não trabalham em defesa de seus interesses.
O tema da pobreza e desigualdade é visto como o que afeta mais diretamente a vida pessoal dos cidadãos, desde nos Estados Unidos até em Senegal, com média global de 21%.
A corrupção, de modo geral, lidera as preocupações, com 23% das pessoas afirmando ser esta uma das principais questões enfrentadas em seus países. Esses índices variam de 6% na Alemanha e 7% no Reino Unido, até 45% em Gana, 44% na Nigéria e 37% na Colômbia.
Segundo o estudo, a questão da segurança é uma preocupação central nos países da América Latina. No Brasil, 74% das pessoas disseram não achar que as leis do país são capazes de fazê-las se sentirem seguras. A sensação também é compartilhada pelos cidadãos da Argentina (73%), Colômbia (65%) e México (60%). Na média global, essa preocupação foi mencionada por 42% dos entrevistados.
Crise climática e classe política
Em média, 58% dos entrevistados se preocupam com a possibilidade de a instabilidade política em seus países resultar em situações de violência no próximo ano. Esse temor foi apontado por 79% dos entrevistados na África do Sul e no Quênia, 77% na Colômbia, 75% na Nigéria, além de dois terços das pessoas nos EUA e na França.
A pesquisa revela que a confiança nos políticos no Reino Unido é de apenas de 20%, em contraste com a média mundial de 30%. A confiança global nas instituições internacionais também está em baixa, com somente 26%. Opiniões abaixo desse patamar foram registradas na Alemanha, França, Japão e Rússia.
Em torno de 70% das pessoas pesquisadas se preocupam que a crise climática possa afetar suas vidas no próximo ano. Os percentuais mais altos foram registrados em Bangladesh (90%), Turquia (85%), Quênia (83%) e Índia (82%). Os menos preocupados com essa questão são os britânicos (54%), russos (48%) e chineses (45%).
A crise do clima foi avaliada como o desafio mais significativo a ser enfrentado pela humanidade por 32% das pessoas na Índia e na Itália, seguidas da Alemanha (28%), Egito (27%), México (27%), França (25%) e Bangladesh (25%).
Crença na democracia em baixa
O presidente da OSF, Mark Malloch Brown, classificou os dados revelados pelo relatório como “preocupantes e alarmantes”. Ele destacou o fato de a maioria das pessoas ao redor do globo acreditarem na democracia, mas acrescentou que “geração após geração essa fé está se dissipando, enquanto aumentam as dúvidas sobre a capacidade [dos regimes democráticos] de realizarem mudanças concretas em suas vidas”.
“A confiança os elementos fundamentais da democracia coexiste com dúvidas profundas sobre suas práticas e seu impacto no mundo real”, disse Malloch Brown, que já atuou como vice-secretário-geral da ONU.
A OSF entrevistou 36.344 indivíduos com idades acima dos 18 anos em 30 países, com representação coletiva de 5,5 bilhões de pessoas. A entidade afirma que o objetivo era pesquisar em torno de mil pessoas por país, mas esses números apresentaram variações em razão de fatores locais.
Entre os 30 países, seis foram escolhidos para pesquisas mais aprofundadas, com mais de 2 mil pessoas entrevistadas. São estes Brasil, França, Índia, África do Sul, Estados Unidos e Egito, embora neste último o total de entrevistados tenha sido de pouco mais de mil.