Desde o último domingo (28), quando o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) da Venezuela anunciou a vitória questionável de Nicolás Maduro para seu terceiro mandato, sem apresentar as atas de votação que comprovam o vencedor do pleito, o povo foi às ruas em protestos massivos, recebendo uma resposta dura da ditadura.
Entre as forças que propagam a violência estão os Coletivos, grupos pró-chavismo que se mobilizam para atacar a oposição e os críticos do regime com “força de choque”.
Com apoio oficial em toda a Venezuela desde que Hugo Chávez chegou ao poder, em 1999, os coletivos têm atuado com mão de ferro contra os opositores do regime, recebendo agora respaldo de Maduro e seus aliados para continuarem nas ruas propagando terror, repressão e violência brutal a serviço da ditadura.
Diversas denúncias de atos violentos cometidos por esses grupos foram relatados nos últimos dias, até mesmo antes da divulgação do resultado do CNE.
Segundo reportado pelo portal Infobae, dezenas de motoqueiros que se identificaram como chavistas chegaram a um centro de votação em Caracas, no domingo, onde havia testemunhas da oposição e cidadãos à espera do início do escrutínio das eleições presidenciais.
Com a chegada dos apoiadores de Maduro, iniciou-se um confronto violento que terminou com agressões físicas no local. A polícia, no entanto, não interveio para interromper o conflito.
No estado de Táchira, grupos armados e encapuzados invadiram o centro de votação da Escola John Kennedy, na localidade de Patiecitos, município de Guásimos e dispararam contra os eleitores que aguardavam entrar no local para participar da votação. Ao menos uma pessoa foi morta nas ações.
A formação dos coletivos foi promovida durante o governo Chávez, iniciado em 1999, por meio da criação dos “cantos quentes”, áreas mais pobres das cidades venezuelanas onde dissidentes e opositores eram proibidos de entrar, sofrendo assédios, insultos e por vezes, sendo atacados fisicamente.
Apesar de se definirem como “movimentos sociais que contribuem para o desenvolvimento do país”, esses agrupamentos paramilitares foram radicalizados para manter o chavismo no poder.
A partir dos anos 2000, quando o conflito político na Venezuela ganhou força, o Executivo, comandado pelo general Hugo Chávez, promoveu os “círculos bolivarianos”, organizações políticas e sociais de conselhos de trabalhadores que também foram apontados como milícias pró-regime. Esses grupos, atuantes nos cantos quentes, então passaram a ganhar forma jurídica.
Em 2002, um grupo de políticos e soldados dissidentes tentou tirá-lo do poder. O líder venezuelano foi então levado de avião para uma base militar numa ilha do Caribe.
Dois dias depois, militares leais o devolveram ao poder, entre manifestações de seus partidários, período que marca a radicalização dos chavistas e os primeiros episódios que mencionam os coletivos.
A primeira e talvez a mais grave ação nesse sentido ocorre com a entrega de pistolas e revólveres aos mais radicais dos “círculos bolivarianos”.
O responsável por esta tarefa foi o general Miguel Rodríguez Torres, na época diretor da Direção dos Serviços de Inteligência e de Prevenção (DISIP, na sigla em espanhol, a primeira polícia da inteligência venezuelana, antecessora do temível Serviço Bolivariano de Inteligência Nacional (Sebin), denunciado por diversos desaparecimentos forçados de ativistas políticos e opositores nos últimos meses.
As raízes dos coletivos estão ligadas a guerrilhas de inspiração cubana, que lutaram contra os governo anticomunistas da Venezuela nos anos 1960. Depois desses conflitos, alguns rebeldes voltaram para os bairros pobres determinados a disseminar o socialismo por meio de atividades comunitárias – oferecendo aulas, exibindo filmes, distribuindo alimentos.
Até 2019, é estimado que os coletivos somavam entre 5.000 e 7.500 membros, com atuação majoritária nas cidades, de acordo com Alejandro Velasco, professor de história da Universidade de Nova York.
A partir de 2014, após a morte de Chávez e o ciclo de protestos anti-Maduro, surgiram os “coletivos disfarçados”, compostos por atuais ou antigos policiais ou guarda-costas do regime.
Essas forças paramilitares são responsáveis por propagar o terror e contribuir com a permanência de Maduro no poder. Nos últimos dias, após novos indícios de fraude eleitoral surgirem na Venezuela, eles atuaram fortemente para enfrentar a população nos protestos.
No último domingo, Diosdado Cabello, vice-presidente do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) e número 2 do chavismo, apelou aos seus seguidores chavistas para que saíssem às ruas e se dirigissem aos centros eleitorais durante a apuração dos votos.
Segundo Cabello, a medida é necessária para “defender o voto popular”, enquanto cresciam as expectativas pelos resultados que o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) anunciaria mais tarde.
“Irmãos e irmãs […] vamos para as ruas, o povo para os centros eleitorais, porque eles não entendem de razões, mas sim de mobilização popular”, declarou Cabello em referência à oposição.
“Então vamos nos mover, vamos nos mover. Eles não compreendem a razão do voto popular, que o povo votou por maioria, que há alguns resultados que a CNE vai dar e esses resultados eles sabem que não os favorecem e vão procurar gerar violência. Então vamos analisar o plano antes, durante e depois de uma vez. Defesa do voto. Dê-lhe um abraço com Bolívar, com Chávez, com Maduro e com o povo. Nós ganharemos”, afirmou o líder chavista na ocasião.
Desde que as ruas foram incendiadas com protestos contra a ditadura, Maduro e seus aliados têm culpado a oposição pela onda de violência no país.
Nesta quarta-feira (31), o ditador disse que o candidato presidencial opositor Edmundo González Urrutia e sua principal apoiadora, Maria Corina Machado, deveriam estar “atrás das grades” por causa de “ações criminosas”.
Maduro, que foi proclamado vencedor das eleições pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), órgão controlado pelos chavistas, sem o total de votos apurados, chamou Urrutia de “covarde” e Machado de “criminosa fascista de extrema-direita”.