A humanidade segue neste ano no ponto mais próximo da sua autoaniquilação, segundo o Relógio do Juízo Final – uma ferramenta criada por cientistas para aferir e alertar a sociedade sobre o risco do apocalipse, representada pela meia-noite.
Como ocorre uma vez por ano, o relógio foi atualizado nesta terça-feira (23/01), e os ponteiros marcam 90 segundos para a meia-noite, exatamente a mesma marca que no ano passado, e a pior da história do relógio.
O relógio foi desenvolvido pelo Boletim dos Cientistas Atômicos logo após o final da Segunda Guerra Mundial, e é uma “metáfora de quão perto a humanidade está da autoaniquilação”. Durante os três anos da pandemia de covid-19, ele permaneceu estável em 100 segundos para a meia-noite.
No anúncio desta terça-feira, o Boletim dos Cientistas Atômicos mencionou como principais riscos a continuidade da guerra na Ucrânia, o ataque do Hamas contra Israel e a guerra em Gaza, o fato de países com armas nucleares estarem modernizando seus arsenais e arriscando uma nova corrida armamentista, o aquecimento global e falta de ação para combatê-lo e riscos da inteligência artificial.
O que é o Relógio do Juízo Final?
Albert Einstein, J. Robert Oppenheimer e outros cientistas que trabalharam no Projeto Manhattan – o programa ultrassecreto de armas nucleares que resultou no lançamento de duas bombas atômicas pelos EUA no Japão – fundaram o Boletim em 1945 em Chicago.
Dois anos depois, eles inventaram o Relógio do Juízo Final. Naquela época, as armas nucleares eram consideradas a maior ameaça à humanidade.
Originalmente fixado em sete minutos para a meia-noite, o mais distante que o relógio esteve do apocalipse foi a 17 minutos para a meia-noite, após o fim da Guerra Fria em 1991.
O Conselho de Ciência e Segurança do Boletim analisa diversos dados para formar uma percepção da gravidade das ameaças globais atuais e decidir o quão perto estamos do fim.
Apesar de ele ter sido criado para alertar sobre a ameaça representada pelas armas nucleares, desde o início dos anos 2000 ele também leva em conta os riscos que as mudanças climáticas e tecnologias disruptivas, como a inteligência artificial, representam para a sociedade.
O Conselho de Ciência e Segurança do Boletim, composto por 17 membros, diz que leva em conta, por exemplo, “o número e os tipos de armas nucleares no mundo, as partes por milhão de dióxido de carbono na atmosfera, o grau de acidez em nossos oceanos e a taxa de aumento do nível do mar“.
O colegiado também considera o quanto os líderes, cidadãos e instituições estão trabalhando para combater essas ameaças.
Qual é o objetivo do relógio?
Os cientistas por trás do Relógio do Juízo Final querem incentivar as pessoas e instituições a agir e mantê-las informadas sobre o mundo em que vivem.
Quando, em agosto de 1945, os EUA lançaram bombas nucleares sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, matando cerca de 100 mil pessoas, deu-se início ao que os cientistas chamam de era nuclear.
Considera-se que os cientistas perceberam ali que haviam criado uma arma de destruição em massa, e que o relógio foi uma tentativa de aumentar a conscientização sobre os perigos de deixar as tecnologias sem controle – talvez porque eles se sentissem responsáveis pelo perigo que eles mesmos haviam criado.
Quase 80 anos após sua criação, os cientistas do Boletim dizem que o objetivo do relógio não é assustar as pessoas, mas mantê-las conscientes.
O Conselho de Ciência e Segurança do Boletim afirma que, embora possa parecer que as ações de um indivíduo são inúteis diante da catástrofe sugerida pelo relógio, há coisas que cada pessoa pode fazer para ajudar a retardá-la.
O colegiado incentiva os cidadãos a “estarem cientes” sobre as “tecnologias poderosas que podem destruir nosso modo de vida”. Também afirma que as pessoas devem compartilhar o conhecimento que têm sobre essas tecnologias e ameaças, e incentiva a população a escrever cartas condenando o gasto de dinheiro público em tecnologias de combustíveis fósseis e armas nucleares.
Os ataques nucleares a Hiroshima e Nagasaki
Ataques às duas cidades japonesas em 1945 são os únicos casos de emprego de armas atômicas numa guerra.
Foto: Kazuhiro Nogi/AFP/Getty Images
O primeiro ataque
Em 6 de agosto de 1945, o avião Enola Gay lançou, sobre Hiroshima, a primeira bomba nuclear da história. A bomba carregava o inocente apelido de “Little Boy”. A cidade tinha então 350 mil habitantes. Um em cada cinco morreu em questão de segundos. Hiroshima foi praticamente varrida do mapa.
Foto: Three Lions/Getty Images
O Enola Gay
O ataque a Hiroshima estava planejado para acontecer em 1 de agosto de 1945, mas teve que ser adiado devido a um tufão. Cinco dias depois, o Enola Gay partiu com 13 tripulantes a bordo. A tripulação só ficou sabendo durante o voo que lançariam uma bomba atômica.
Foto: gemeinfrei
O segundo ataque
Três dias depois do ataque a Hiroshima, os americanos lançaram uma segunda bomba, sobre Nagasaki. A cidade de Kokura era o alvo original do ataque, mas o tempo nublado fez com que os americanos mudassem seus planos. A bomba apelidada de “Fat Man” tinha uma potência de 22 mil toneladas de TNT. Estima-se que 70 mil pessoas morreram até dezembro de 1945.
Foto: Courtesy of the National Archives/Newsmakers
Alvo estratégico
Em 1945, Nagasaki era sede da Mitsubishi, então fábrica de armas responsável por desenvolver os torpedos usados no ataque a Pearl Harbor. No entanto, apenas alguns soldados japoneses estavam baseados na cidade. A má visibilidade não possibilitou um ataque direto contra os estaleiros da fábrica.
Foto: picture-alliance/dpa
As vítimas
Durante meses após os ataques, dezenas de milhares de pessoas morreram por causa dos efeitos das explosões. Somente em Hiroshima, até o fim de 1945, 60 mil pessoas morreram por conta da radiação, de queimaduras e outros ferimentos graves. Em cinco anos, o número estimado de vítimas dos dois bombardeios atômicos é de 230 mil pessoas.
Foto: Keystone/Getty Images
Terror no fim da guerra
Depois de Hiroshima e Nagasaki, muitos japoneses temeram um terceiro ataque, a Tóquio. O Japão declarou então sua rendição, pondo fim à Segunda Guerra também na Ásia. O então presidente americano, Harry Truman, ordenou os bombardeios. Ele estava convencido de que essa era a única maneira de acabar com a guerra rapidamente. Para muitos historiadores, no entanto, os ataques foram crimes de guerra.
Foto: AP
A reconstrução
Devastada, Hiroshima foi reconstruída do zero. Apenas uma ilha, no rio Ota, foi mantida e se tornou o Parque Memorial da Paz. Hoje, há uma série de memoriais: o Museu Memorial da Paz de Hiroshima; a Estátua das Crianças da Bomba Atômica; as Ruínas da Indústria e Comércio; e a Chama da Paz, que vai permanecer acesa até a última bomba atômica do planeta ser destruída.
Foto: Keystone/Getty Images
Contra o esquecimento
Desde 1955, o Museu da Bomba Atômica e o Parque da Paz de Nagasaki prestam homenagem às vítimas dos ataques. No Japão, a reverência às vítimas desempenha um grande papel na cultura e na identidade nacional. Hiroshima e Nagasaki se tornaram símbolos mundiais dos horrores das armas nucleares.
Foto: Getty Images
Dia para relembrar
Desde os ataques de agosto de 1945, as pessoas em todo o mundo lembram as vítimas dos bombardeios atômicos. Em Hiroshima, acontece anualmente um memorial. Sobreviventes, familiares, cidadãos e políticos se reúnem para um minuto de silêncio. Muitos japoneses estão engajados contra o desarmamento nuclear.
Foto: Kazuhiro Nogi/AFP/Getty Images